Petróleo

“Bioquerosene de Óleo Vegetal”

Um processo inovador para a produção de bio querosene a partir de vários tipos de óleos vegetais, que poderá tornar o combustível usado em aviões menos poluente e mais barato, foi desenvolvido na Faculdade de Engenharia Química (FEQ) da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). A patente da tecnologia já foi depositada pela Agência de Inovação da universidade (Inova Unicamp). Após sua extração e refino, o óleo é colocado em um reator junto com uma quantidade específica de etanol e um catalisador, responsável por acelerar as reações químicas. “A maior contribuição do processo de obtenção do bio querosene são os altos índices de pureza do produto final. Outra é a possibilidade de utilização de praticamente qualquer tipo de óleo vegetal como matéria-prima”, disse Rubens Maciel Filho, professor do Departamento de Processos Químicos da FEQ e coordenador do estudo, à Agência FAPESP. “O processo pode ser dividido em duas etapas principais. Na primeira etapa ocorrem reações químicas por meio de um catalisador e, na segunda, as relações óleo-etanol são otimizadas considerando variáveis como temperatura e tempo visando a atingir a melhor conversão dos óleos em bio querosene purificado”, explicou.

 

No interior do reator ocorre a reação de transesterificação (do álcool com o óleo vegetal) que leva à formação do bio querosene, menos poluente que os combustíveis de origem fóssil por não emitir enxofre, compostos nitrogenados, hidrocarbonetos ou materiais particulados. “Além de ser feito a partir de óleos vegetais, outra vantagem ambiental desse combustível renovável é que, ao emitir dióxido de carbono no ar em altitudes elevadas, ele contribui para o crescimento das plantas no solo, que absorvem o dióxido de carbono e conseguem manter seu balanço energético”, explicou Maciel Filho, um dos coordenadores do Programa FAPESP de Pesquisa em Bioenergia (BIOEN).

 

Em uma segunda etapa de produção, os pesquisadores separam todos os produtos da reação: o bio querosene, o catalisador, a água e a glicerina. O isolamento ocorre em uma unidade de separação em condições de temperatura e pressão que tornam o biocombustível economicamente viável. Um dos segredos do processo está na dosagem precisa das proporções de óleo vegetal, álcool, catalisador e temperatura adequada. “Conseguimos um grau de pureza que chega a 99,9%. Não há registros de produtos semelhantes no mercado brasileiro ou internacional. E é exatamente esse alto nível de pureza que permite a utilização do biocombustível em altas altitudes”, disse Maciel Filho, que também coordena o Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Bio fabricação (Bio fabris), um dos Institutos Nacionais de Ciência e Tecnologia (INCTs) que, no Estado de São Paulo, são apoiados pela FAPESP por meio da modalidade Auxílio à Pesquisa – Projeto Temático.

Segundo Maciel Filho, o procedimento tecnológico gera como subprodutos a glicerina, água e o que sobra do etanol não consumido nas reações, sendo que, após a separação desses compostos indesejados, o óleo fica mais fino e com menor viscosidade. “Essa etapa de separação dos compósitos é uma das grandes inovações do processo. Pelos cálculos preliminares, o custo final do bio querosene será cerca de 30% mais barato que o querosene oriundo de fontes fósseis, devido, por exemplo, aos baixos custos de energia utilizada em seu processo de produção”, apontou. Depois da criação e aperfeiçoamento da tecnologia, o bio querosene foi enquadrado dentro dos requisitos para combustível de aviação, estabelecidos pela Agência Nacional do Petróleo (ANP). “A tecnologia já está em processo de transferência para as empresas interessadas”, disse.

A quantidade de etanol utilizada no processo foi otimizada através de extensivos estudos e é um ponto importante do processo. “O papel do catalisador é acelerar a reação química e fazer com que ela ocorra em uma temperatura mais baixa”, explica Rubens Maciel Filho, um dos responsáveis pela pesquisa. Dentro do reator ocorrem as reações de transesterificação e ou esterificação, levando à formação do éster – o bio querosene. A segunda etapa é a mais importante, quando é feita a separação de todos os produtos da reação, ou seja, o isolamento do éster, do catalisador, da água e da glicerina. Reside aí a grande inovação do processo de produção do bio querosene desenvolvido pela equipe de Maciel Filho. O isolamento é feito em uma unidade de separação intensificada, em condições de temperatura e pressão que possibilitam a obtenção do bio querosene de forma economicamente viável, e que atende aos requisitos para o querosene de aviação, estabelecidos pela Agência Nacional do Petróleo (ANP).

O etanol foi o álcool escolhido pela equipe para o processo por ter baixa massa molar e ser um reagente não agressivo e renovável. Ele reage com o ácido graxo, dando origem ao bio querosene. Além disso, o processo gera como subprodutos a glicerina, água e o que sobra do etanol não consumido nas reações. Após a separação desses compostos indesejados, o óleo fica mais fino e com menor viscosidade. A produção de um biocombustível a partir de óleos vegetais é bem conhecida. A inovação do novo processo é a qualidade específica e o uso do bio quereosene em aplicações aeronáuticas, dentro de padrões mais exigentes da indústria.

Outra novidade deste processo é o balanço preciso das diversas variáveis envolvidas nas reações químicas e também a purificação as quais resultam no bio querosene com as propriedades desejadas. “Para se obter alta conversão de óleo vegetal em bio querosene e maximizar a produção no menor tempo possível é preciso saber as quantidades exatas a serem usadas de cada componente da reação e definir as condições apropriadas de operação”, explica Maciel Filho. “É preciso dosar com precisão a proporção de óleo vegetal, álcool e catalisador, além da temperatura mais adequada”, acrescenta.

 

Não existem, no Brasil, instituições que possam atestar se o produto obtido atende às especificações do querosene de aviação. “Contudo, os resultados das análises feitas na Unicamp e no IPT foram comparados com a Tabela de especificação do querosene de aviação da ANP”, explicam os pesquisadores. “Ficou demonstrado que o bio querosene possui características semelhantes às do querosene de aviação.”

Embora haja uma série de pesquisas, e diversos biocombustíveis sendo testados em várias partes do mundo, inclusive no Brasil, a equipe não identificou processo/produto similar ao desenvolvido. Apesar de ser comentada a existência de experimentos e realizações de testes fazendo uso de bio querosene, não foi identificada patente na literatura técnica que fizesse uso do mesmo processo, comenta Maciel Filho. “Também não foi encontrado no mercado produto identificado como bio querosene”.

O professor da FEQ ressalta que pode não haver um produto exatamente igual, mas já existem companhias aéreas com aviões voando experimentalmente movidos a biocombustíveis. É o caso da americana Continental Airlines, que anunciou recentemente a realização do primeiro voo de demonstração, com o uso de biocombustível.

Assim, as pesquisas realizadas pelo grupo da Unicamp podem contribuir com o desenvolvimento de processos de produção viáveis para a obtenção de biocombustíveis para a aviação por propulsão a jato, um segmento importante nos transportes, estando no âmbito do empenho mundial na redução da emissão de poluentes, avaliam os pesquisadores. Os biocombustíveis, como o bio querosene, têm ainda outra vantagem em relação aos combustíveis tradicionais: eles são provenientes de fontes renováveis. “Além disso, sendo produzido a partir de fontes renováveis e obtidas no País, o bio querosene poderá contribuir para a independência tecnológica nacional, além de agregar valor à matéria-prima”, dizem os pesquisadores.

Os próximos passos que os pesquisadores precisam para avançar na consolidação do produto são a realização de testes em motores de avião e a produção em escala semi industrial. Para isso, a Agência de Inovação da Unicamp (Inova), codetentora da patente, está interessada em negociar com empresas a cessão do direito de explorar comercialmente a nova tecnologia. O mercado é enorme. Segundo a Iata, o movimento em 2007, último dado disponível, foi de US$ 136 bilhões, correspondendo a 28% dos custos operacionais das companhias aéreas. O processo de produção do biocombustível a partir de óleos vegetais é conhecido e semelhante ao do biodiesel, só que mais trabalhoso. Nos dois casos é promovida uma reação química chamada transesterificação, na qual o óleo vegetal, obtido do esmagamento do fruto de plantas oleaginosas e após o refino, reage com um álcool e um catalisador (substância que promove a reação química) e dá origem ao combustível. O processo desenvolvido para a produção do bio querosene utiliza etanol de cana-de-açúcar como reagente, outra matéria-prima renovável. “Para o caso do bio querosene, a etapa de engenharia da separação é muito mais elaborada para atender às características e especificações dos combustíveis de aviação que são muito rígidas”, explica Maciel, que contou nos estudos e na patente com participação dos pesquisadores Maria Regina Wolf Maciel, Cesar Benedito Batistella e Nívea de Lima da Silva, todos da Unicamp. “O bio querosene deve ser muitíssimo puro, livre de vários compostos e impurezas que podem comprometer a qualidade do sistema de combustão a jato, além de ter viscosidade, densidade e poder calorífico muito específico, o que não é requerido do biodiesel.”

 

Fonte:

http://www.agencia.fapesp.br/materia/11133/bioquerosene-de-oleos-vegetais.htm Bioquerosene de óleos vegetais 29/9/2009 Por Thiago Romero Agência FAPESP

http://buscatextual.cnpq.br/buscatextual/visualizacv.jsp?id=K4781251U9

http://www.inovacaotecnologica.com.br:80/noticias/noticia.php?artigo=unicamp-cria-bioquerosene-aviacao-partir-oleos-vegetais&id=010115090929&ebol=sim

acesso em setembro de 2009

Revista Pesquisa Fapesp, 13-11-2009 Evanildo da Silveira