Metalúrgia

“Brazilian Test”

A engenharia brasileira deve muito a Fernando Lobo Carneiro, que faleceu em novembro de 2001: autor de métodos adotados internacionalmente nessa área, trabalhou por três décadas no Instituto Nacional de Tecnologia (INT), fundou na Coppe a pós-graduação em engenharia civil no Brasil. Por 33 anos trabalhou no INT, sobretudo com resistência de estruturas. Elaborou um método de dosagem experimental de concretos amplamente aplicados e um método para calcular a resistência dos concretos à tração, adotado em todo o mundo e conhecido como brazilian test – ensaio brasileiro. Lobo Carneiro foi consultor de obras no Rio de Janeiro como o elevado Paulo de Frontin e a ponte Rio-Niterói e criador do grupo de engenharia para exploração de petróleo off shore no Programa de Engenharia Civil da Coppe.

 

O ensaio Dosagem de Concretos (1943) apresenta um método experimental conhecido como “método do INT”, que estabelece as proporções dos componentes empregados na elaboração do concreto. No mesmo ano, o engenheiro desenvolveria um método internacional para calcular a resistência dos concretos à tração. Em 1948 o trabalho foi levado à reunião de fundação da Rilem (International Union of Testing and Research Laboratories for Materials and Structures), que reuniu 14 chefes dos mais importantes laboratórios de engenharia do mundo. No Brasil, na época, ninguém deu muita importância aquilo, mas na França logo começou a ser usado e passou a ser chamado de “essai brésilien”. Em 1984 o método foi agraciado com o prêmio “Interamericano de Ciência Bernardo Houssay”. O método foi popularizado como brazilian test e oficialmente adotado pela Associação Internacional para Padronização (ISO) na década de 1980. Soube-se então que havia um estudo semelhante no Japão, realizado poucos meses depois, no período da guerra. Lobo Carneiro tentou em vão contato com o pesquisador.

O ensaio Brazilian Test empreendido pela Divisão de Industrias de Construção DO INT, teve origem casual, pois resultou de uma solicitação de ensaios de rolos de concreto, por parte da firma Estacas Franki Ltda, em 1942. Este trabalho foi supervisionado por Fernando Lobo Carneiro e apresentou resultados imprevistos; “verificou-se que a ruptura se dava por tração segundo o plano diametral em que atuavam as forças de compressão”. Esta constatação levou Lobo Carneiro a realizar um estudo teórico do problema que conduziu “à criação de um novo método para a determinação da resistência à tração dos concretos, por meio de ensaio de compressão diametral de corpos de prova cilíndricos” O pedido da Estaca Franki, vale acrescentar, visava à remoção da Igreja de são Pedro, localizada na esquina da antiga Rua São Pedro com a Rua dos Ourives (atual Miguel Couto), para a abertura da atual Avenida Presidente Vargas. Os rolos enviados para teste, ao INT, teriam a função de sustentar pistas de concreto sobre as quais se faria o deslocamento da Igreja. Entretanto, os exames realizados nas alvenarias levaram à conclusão de que o desmoronamento não justificava o custo da remoção de cinco milhões de cruzeiros, na época, nem o impacto político de um insucesso, pois a oposição ao prefeito Henrique Dodsworth já compusera até uma música de crítica a essa obra, que não chegou a ser empreendida. O novo método foi apresentado por seu autor na 5ª Reunião da Associação Brasileira de Normas Técnicas em setembro de 1943 e, dez anos mais tarde, soube-se que, por singular coincidência, o pesquisador japonês Tsuneo Akasawa chegara, independentemente, aos mesmos resultados, em Tokio, em novembro de 1943, cerca de dois meses após a comunicação do engenheiro brasileiro.(17) Através da RILEM -Reunião Internacional dos Laboratórios de Ensaios -, o método de Lobo Carneiro foi divulgado internacionalmente, tendo sido adotado pelo Comitê Europeu de Concreto, pela própria RILEM e pela American Society for Testing Materiais.

Em 1943, durante a Segunda guerra Mundial, Lobo Carneiro estava no início de carreira, quando surgiu a ideia de se deslocar a igreja de São Pedro – uma igreja histórica, pequena, barroca e com planta elíptica – para o outro lado da Avenida Presidente Vargas, de modo a evitar que fosse demolida. O projeto consistia em substituir a parte inferior das paredes da igreja por concreto. Sob o concreto, seriam colocados rolos que serviriam para deslocar a igreja até o outro lado da avenida. A Franki – uma empresa de fundações e infraestruturas – tinha tido sucesso na Europa no transporte de construções sobre rolos de aço. Mas aqui no Brasil surgiu a ideia de fazer rolos de concreto. Os de aço eram calculados pela fórmula de Hertz, mas a questão era como calcular os de concreto. Eram rolos de 60 cm de diâmetro. Quando Lobo Carneiro pôs o rolo de concreto na máquina, ele quebrou de uma maneira inteiramente diferente dos de aço: por uma fissura vertical, abrindo-se em dois. Lobo Carneiro estudou o caso e lhe ocorreu propor um novo método para a determinação da resistência à tração dos concretos. A resistência à compressão era determinada em cilindros ensaiados verticalmente. Pondo esses cilindros deitados entre os pratos da máquina determinaria a resistência à tração.

A igreja acabou sendo demolida, porque suas alvenarias eram bastante espessas – algumas tinham mais de um metro – mas completamente heterogêneas. Dentro delas havia pedaços de estátuas, madeira, tijolos, etc., o que as tornava fracas. Além disso o prefeito da época, Henrique Dodsworth, começou a ser ridicularizado. Diziam: “o velho está gagá, quer deslocar uma igreja sobre rolos..”, embora esse tipo de transporte tivesse sido feito na Europa com êxito. Fizeram até um samba sobre o assunto. O prefeito mandou então um ofício à Franki, perguntando se a empresa garantia que a igreja chegaria intacta do outro lado da avenida. O diretor respondeu: “Garantir eu não posso, porque dada a heterogeneidade das paredes da igreja pode haver um acidente durante o transporte e ela desmoronar”. Diante disso o prefeito deu o caso por encerrado e mandou demolir a igreja.

 

Fonte:

http://www.uol.com.br/cienciahoje/perfis/lobo/lobo1.htm

Revista do CREA, n.37 fevereiro/março 2002, pág. 22

Cientistas do Brasil, SBPC,1998, página 504

Acesso em dezembro de 2001

http://www.schwartzman.org.br/simon/int/int2.htm#2.%20Prestigio%20e%20crescimento:%20a%20questão%20metrológica

Acesso em novembro de 2007