Biotecnologia

“Café ICATU”

A ferrugem é, sem dúvida, a doença mais comum nas lavouras brasileiras e de todo o mundo. Porém, não deixa de representar grande risco ao cafeeiro. A ferrugem também é a doença sobre a qual foram feitos mais trabalhos de pesquisas até a atualidade. Ela foi constatada em 1970, no sul da Bahia. A doença é caracterizada pelo aparecimento de manchas nas faces superior e inferior das folhas. Elas são causadas pela ação do fungo Hemileia vastatrix, que é um parasita foliar obrigatório do café. Existem duas espécies do gênero Hemileia que provocam a ferrugem. A espécie coffeicola tem efeitos mais brandos e não está presente no Brasil. As manchas provocadas pelo fungo têm, no início, uma coloração amarela clara na parte inferior das folhas. Com a evolução do estágio de infecção, a mancha aumenta e atinge tons alaranjados e com aspecto empoeirado. Na face superior da folha infectada também aparecem manchas amareladas. O período prolongado de ação propicia ainda o aparecimento de outros fungos do gênero Verticillium, que dão um aspecto esbranquiçado à lesão.

 

A ação da ferrugem provoca queda precoce das folhas e a secagem dos ramos, que, em consequência disso, não produzirão frutos no ano seguinte. A ocorrência da ferrugem está sempre relacionada à queda na produtividade das safras seguintes. Os prejuízos provocados pela doença podem ser representados por quedas de aproximadamente 35% na produtividade. O fungo encontra facilidade para a disseminação pela lavoura bastando, para isso, contar com o auxílio de insetos, chuvas, animais e até mesmo do homem. As condições ideais para os fungos atacarem a folha são temperaturas entre 22ºC e 25ºC, ausência de luz direta e água. A ferrugem também tem preferência por cafeeiros que tenham muitas folhas. O controle da doença dever ser feito com a aplicação de fungicidas. Por favorecer a proliferação da enfermidade e a germinação do fungo, as lavouras devem estar protegidas durante o período de chuvas. Em grande parte das regiões cafeeiras do Brasil, esse período compreende os meses de novembro a abril. As aplicações podem ser feitas através do solo ou diretamente nas folhas. Para aplicações no solo, pode ser feito o controle integrado, ou seja, além da ferrugem, outras doenças podem ser tratadas. Porém, em algumas regiões brasileiras o controle da ferrugem está relacionado com o aumento de pragas, como, por exemplo, o ácaro.

Além de pesquisas sobre a doença, grandes também são os investimentos no desenvolvimento de cultivares resistentes à ferrugem, através do melhoramento genético. Esta tem sido considerada a melhor opção para combater a doença. Dentre as variedades resistentes estão o Icatu vermelho, o Icatu amarelo, o Obatã, o Iapar 59, o Tupi. A grande maioria dos cultivares foi criada pelo IAC (Instituto Agronômico de Campinas). A história do café no Brasil se confunde com a do Instituto Agronômico IAC. A Estação Agronômica de Campinas, primeiro nome do IAC – foi criada por decreto do imperador D. Pedro II, em 1887, para estabelecer critérios técnicos e científicos ao cultivo de café na região. A cultura foi introduzida em Campinas, em 1807, pois era uma região que favorecia consideravelmente a concentração de cafeicultores. Em 1932, o IAC elaborou um amplo programa de pesquisa, envolvendo diferentes áreas da ciência. Esse trabalho lançou critérios técnicos para o cultivo racional do cafeeiro e criou variedades mais produtivas. Graças ao IAC, o Brasil tornou-se o principal produtor e exportador mundial de café.

Alcides Carvalho, emérito pesquisador, liderou, a partir da década de 40, a continuidade do programa pioneiro de melhoramento genético. Em 1935 recém formado pela Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq) , em Piracicaba, São Paulo, foi convidado para trabalhar no IAC onde começou a colaborar no “Plano geral de estudos do cafeeiro”. Na época tudo parecia muito utópico, porque justamente em 1932/33 o Brasil não sabia o que fazer com o enorme volume de café armazenado, e milhares de sacas eram queimadas. Praticamente todos os cultivares plantados atualmente no Brasil tiveram origem na Seção de Genética do IAC, de que esse pesquisador foi chefe de 1948 a 1981. A finalidade precípua do Instituto era conseguir linhagens mais produtivas, para que o Brasil pudesse competir no mercado internacional. Todo o material coletado, tanto de variedades como de espécies de café, foi sendo conservado em coleção, no banco de germoplasma, mantido atualmente em Campinas, um dos mais completos do mundo. Alcides Carvalho faleceu em 1993.

O IAC mantém até hoje pesquisas de ponta que oferecem grandes soluções para o agronegócio do café. Os cultivares desenvolvidos pelo IAC representam cerca de 90% do café plantado em várias regiões do Brasil. Alguns desses cultivares constituem a base da cafeicultura de outros países produtores. O cultivar mais plantado é o Mundo Novo, de porte alto, que se destaca por sua capacidade de adaptação e produtividade, embora suscetível às principais pragas e moléstias da cultura. Esta variedade começou a ser estudada quando se soube que na região de Araraquara, uma plantação de café chamava a atenção pelo vigor e pela produtividade. Técnicos do IAC visitaram a fazenda, no município de Mundo Novo, hoje Urupês, e colheram sementes das melhores plantas, selecionadas como matrizes. Essas sementes foram plantadas nas estações experimentais do instituto, onde durante vários anos suas produções individuais foram acompanhadas. Em geral, o período de avaliação dos progênies se estende por vinte anos. No caso específico do mundo-novo, depois de dez anos as sementes começaram a ser distribuídas, dado o imenso valor que o material apresentava. Uma das principais características do Mundo Novo é a alta produtividade de seus cafeeiros. Apesar dessa vantagem, o grande porte do Mundo Novo dificulta sua colheita. Devido a essa constatação, o IAC realizou novos estudos. O resultado foi o surgimento da variedade Catuaí, que significa “muito bom”. Dentro desta variedade, existem duas linhagens: o Catuaí Vermelho e o Catuaí Amarelo.

Segundo Alcides Carvalho: “Em 1970, quando a ferrugem chegou ao Brasil, não fomos pegos de surpresa, porque havia anos estávamos trabalhando com material portador de resistência genética ao fungo. Havíamos previsto que a ferrugem chegaria a Campinas, uma vez que aqui temos aeroporto internacional. Desde 1953 vínhamos estudando material com resistência ao agente da ferrugem, proveniente da África e da Índia. Como não tínhamos ferrugem no país contávamos com a colaboração de técnicos do Centro de Investigação das Ferrugens do Caffeeiro, em Oeiras, Portugal. Híbridos desse material resistente e dos nossos cultivares, bem como todas as seleções de C. arábica e de híbridos interespecíficos , foram para lá, para serem analisados. Quando a ferrugem chegou, já sabíamos qual era o material que melhor resistia a ela, que fatores genéticos poderiam ser transferidos para os nossos cultivares e o que deveria ser feito dali em diante. A colaboração com Portugal foi valiosa.”

O café Icatu foi sintetizado em Campinas, e suas atuais linhagens já se parecem com as de Mundo Novo. Resultou, porém, da hibridação feita em 1950, entre o cv. Robusta de C. canephora (tetraplóide) com o Bourbon Vermelho, e com cruzamento para o Mundo Novo. Várias plantas de Icatu também são portadoras de genes que conferem resistência às raças conhecidas de H. vastatrix (Monaco et al., 1974). O Icatu vem sendo estudado intensivamente para se conseguirem linhagens resistentes ao agente da ferrugem e, ao mesmo tempo, produtivas, uniformes, sem elevada quantidade de grãos chochos ou mocas e de boas qualidades de bebida. Esses estudos não são fáceis e demandam longo tempo para dar resultados práticos, exigindo exame de elevado número de progênies e plantas individuais.

Os cultivares lcatu Vermelho, Icatu Amarelo e lcatu Precoce, resistentes à ferrugem, principal moléstia da cultura, foram também desenvolvidos pelo IAC. A diminuição do uso de agroquímicos e o consequente controle da poluição ambiental representam importante contribuição para a sociedade. Os cultivares ICATU têm sido plantados em quase todas as regiões cafeeiras do Brasil. Trata-se de material de porte alto, muito vigoroso e de excelente capacidade de rebrota quando submetido à poda. O espaçamento para o plantio é semelhante ao indicado para o ’Mundo Novo’, cujas linhagens não admitem plantios muito adensados (não deve ser inferior a 3,00 m entre linhas e de 0,80 a 1,00 m entre plantas), dependendo da região. Embora algumas linhagens se mostrem bem adaptadas a regiões de altitude, outras constituem se em boa opção para regiões mais baixas e quentes que, no geral, são marginais para o plantio de outros cultivos.

 

Fonte:

http://homepage.barao.iac.br/produtoseassuntos/produtos/café/caféseculo/o_café_no_brasil.htm

http://www.coffeebreak.com.br/ocafezal.asp?SE=2&ID=6

http://www.iac.br/~oagronom/511/cultivaresiac/cafe.htm

http://globorural.globo.com/barra.asp?d=/edic/182/15anos.htm

http://www.cooxupe.com.br/cafe/historicocompleto.htm

 

acesso em março de 2002

Cientistas do Brasil, SBPC, 1998, página 198