Eletrônica

Pandora

Um estagiário do Departamento de Física da Unesp precisou de apenas R$ 60 mil para construir um supercomputador avaliado em R$ 4,9 milhões. João Carlos Câmera Júnior, 22 anos, montou, em três semanas, uma máquina que unifica 16 PCs de alta velocidade, com 40 gigabytes de HD cada, totalizando quase um terabyte de disco disponível. Batizado de Pandora pelo próprio João Carlos, que está terminando o curso Matemática no Instituto de Biociências, Letras e Ciências Exatas (Ibilce) da Unesp, o supercomputador tem um processador 120 vezes mais rápido que outra máquina comum para esse tipo de atividade. Ele faz em 12 horas o que os outros computadores levariam 30 dias. O projeto foi orientado pelo físico Walter Filgueira de Azevedo Jr., que coordena um grupo de pesquisadores envolvidos na descoberta de estruturas tridimensionais de proteínas associadas ao estudo e produção de medicamentos no combate a doenças como o câncer, a tuberculose e a malária. 


O supercomputador tem sido usado para simulação de estruturas de proteínas identificadas nos projetos de estudo do genoma. Graças a ele, o trabalho de simulação dessas proteínas, que demorava semanas, agora pode ser realizado em poucas horas. “As máquinas caras que usávamos não davam conta do recado. Já testamos várias drogas potenciais contra tuberculose, câncer e remédios que podem matar a bactéria causadora do amarelinho, a doença dos laranjais”, explica Filgueira. “Eu não esperava todo esse boom”, conta o aluno, que já pensa na próxima supermáquina. Depois do projeto realizado, João Carlos disse que já recebeu proposta até de ir para o exterior. “Ainda não sei ao certo o que vou fazer, mas por enquanto fico por aqui porque já tenho um projeto em andamento que está crescendo e tem grandes perspectivas”, conta entusiasmado. 

A ideia surgiu no grupo do Laboratório de Sistemas Bio Moleculares, da Unesp, em São José do Rio Preto. João Carlos se propôs a colocar em prática o projeto e começou a montar o supercomputador. “Fizemos contato com o Instituto de Estudos Avançados do Centro Técnico Aeroespacial (CTA), em São José dos Campos, no laboratório do professor Ângelo Passaro, que imediatamente aceitou o aluno a fazer um estágio lá, onde era feita a montagem de computadores”, explica o professor. “Lendo artigos científicos conhecemos a ‘arquitetura paralela’, o sistema cluster ‘Beowulf’, e logo vimos o potencial para atuar nesta área da biologia. No entanto, este sistema não era aplicado em bioinformática”, conta o professor. Além da construção da supermáquina, outro grande desafio é a adaptação dos programas usados para esse tipo de arquitetura paralela. Segundo Walter Filgueira, o sistema operacional normalmente usado é baseado no Linux, “porque é mais estável”. Prova disto é que a máquina está ligada desde o dia 22 de abril do ano passado e nunca travou. Poucos laboratórios no mundo têm esse tipo de computador aplicado a problemas biológicos. A maioria é usada para meteorologia e física nuclear. 

“Estamos desenvolvendo outros conjuntos de softwares com uma equipe de 20 pessoas. Sobre o tema, estão saindo dissertações de mestrados e teses de doutorado”, conta o professor. Segundo Filgueira, dois laboratórios brasileiros já entraram em contato, interessados no projeto. A intenção é que João Carlos, após terminar o curso de Matemática, comece a fazer um doutorado em biofísica, no desenvolvendo projetos de supercomputação. “Ele não precisará de mestrado por conta do ótimo desempenho nos seus trabalhos e por já ter artigos científicos publicados”, revela o orientador. Essa e outras pesquisas do instituto contam com o apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), que, nos últimos dois anos, fez investimentos com valor superior a US$ 300 mil no laboratório. O nome Pandora é alusão à célebre caixa da mitologia grega. Seu interior possuía todos os males do mundo e também dois olhos verdes da esperança. Segundo o estudante, pode-se tirar de um supercomputador coisas boas ou ruins. “Vamos extrair apenas o que há de melhor”, garante o aluno. 

Fonte: http://www.biocristalografia.df.ibilce.unesp.br 
acesso em março de 2003