Automóveis

Romiseta

O Romi-Isetta é o carro mais exótico já fabricado no Brasil. O eixo traseiro é bem mais estreito que o dianteiro e ela aparenta ser ainda menor do que realmente é, com 2,27 metros de comprimento por 1,38 metro de largura. Entra-se nele literalmente pela frente. Foi justamente por falta de uma segunda porta que o carrinho, lançado em 1956, não foi considerado oficialmente o primeiro carro nacional. No ano anterior, as Indústrias Romi, que até hoje fabricam máquinas operatrizes em Santa Bárbara d’Oeste (SP), deram início à fabricação da versão brasileira da Isetta, sob licença da fábrica italiana Iso. Em 9 de abril de 1953, a empresa ISO Automoveicoli-Spa, fabricante de pequenas motocicletas e triciclos comerciais, fundada pelo gênio Enzo Rivolta, Isetta 53 – motor ISO apresentou no salão de Turin um projeto iniciado em 1952 denominado Isetta, (pequena ISO), do engenheiro chamado Preti. Apesar da boa aceitação no mercado italiano, devido às suas características peculiares como porta frontal para facilitar o acesso, dimensões diminutas, boa dirigibilidade e performance razoável para a época (máxima de 70km/h) fazendo até 25km/l, a sua “vida” na Itália teve um curto período. Sua fabricação encerrou-se em 1956, quando esta fábrica transferiu todo seu maquinário para a empresa Romi, no Brasil, onde, segundo registros, o Comendador Américo Emílio Romi, proprietário da empresa Máquinas Agrícolas Romi, em Santa Bárbara do Oeste – SP, conhecido por sua excelente visão de futuro, assinou contrato em 7 de fevereiro de 1956 para início de fabricação da Romi-Isetta. Ainda em 1955, a ISO concedeu licença à BMW para fabricação na Alemanha, cuja empresa adaptou o motor ISO de 200cm3 para um motor monocilíndrico de 243cm3 adaptado de motocicleta, sendo substituido Pick-up Isetta (bélgica N.V.Anc.Ets.Pillette) logo em seguida por um mais potente de 300cm3, produzindo 161.728 Isettas. Além da BMW, foram concedidas licenças também para a empresa francesa VELAM, a espanhola Borgward-Iso, a brasileira Romi e a belga N.V.Anc.Ets.Pillette, que fabricou inclusive um modelo pick-up. Estes veículos tiveram uma vida útil muito curta, apesar de seu sucesso, não passando do ano de 1962. 

No Brasil, com o contrato já assinado, o Comendador Romi, apostando que o futuro seria dos automóveis compactos, ágeis e econômicos, e não das grandes banheiras Comendador Américo Emílio Romi americanas tipo rabo de peixe, publicou no Diário de São Paulo em 28 de agosto de 1955 que suas indústrias ROMI iriam iniciar a produção do Romi-Isetta, onde com o tempo, segundo consta, devido às suas características curvilíneas e ousadas, o povo brasileiro passou a chamar de a Romiseta (ou a Romi-Isetta). Apesar de alguns veículos da época terem até 40% de seus componentes fabricados no Brasil, estes não eram montados aqui. Estava nascendo em 5 de setembro de 1956 – quarta-feira, dois dias antes da comemoração da independência do Brasil, o primeiro veículo nacional fabricado em série, com 70% de nacionalização, dois meses antes do lançamento da Vemaguete, da fábrica Vemag. Depois de apresentado ao então governador Jânio Quadros, o centro de São Paulo parou Desfile das primeiras Isettas em 1956 para ver o desfile da primeira série de veículos Romi-Isetta fabricados em Santa Bárbara d’Oeste, a 150 km de São Paulo. 

Apesar do ambiente propício de desenvolvimento que o Brasil estava vivenciando, dos históricos 50 anos em 5 de Juscelino Kubitschek, as fábricas Romi tiveram um curto período de sucesso e euforia, onde chegaram a anunciar dez dias depois se seu lançamento notícias que “já foram vendidas 540 Romi-Isettas”. Fabricadas com motor ISO de 250 cm3 entre 1956 e 1958, estes veículos não tiveram modificações, excetos mudança da posição dos faróis, pára-lamas, lanternas traseiras, etc. Em 1959, junto com a mudança da mecânica ISO pelo motor BMW 300, a indústria passa a ter problemas financeiros motivados por pressões do GEIA – Grupo Executivo da Indústria Automobilística, que foi criado por decreto no.39.412 pelo JK em 16 de maio de 1956, órgão ironicamente responsável pelo incentivo de fabricação de veículos nacionais, desde que obedecessem ao padrão estabelecido pelas multi-nacionais, com o mínimo de dois bancos e o mínimo de duas portas. 

Não sendo considerado um veículo (dentro das regras estabelecidas), a indústria não possuía então os incentivos do governo, consequentemente, seus custos eram elevados em comparação à um DKW ou Volkswagen. Juscelino Kubistchek na Caravana de Integração Mesmo com a simpatia e o apoio do presidente Juscelino Kubistchek à produção, entrando em Brasília a bordo de uma Romi-Isetta integrante da Caravana de Integração Nacional que percorreu 6.900 Km de Rio de Janeiro até Brasília, a fabricação foi definitivamente encerrada em 1959, montando-se ainda algumas unidades em 1960 com as peças existentes e umas poucas em 1961 com as remanescentes. A fabricação de 3.000 unidades no Brasil no período de 1956 até 1961, principalmente se comparados às 22.543 Isettas-BMW fabricadas somente em 1956 pela Alemanha, fica como uma triste lembrança de quanto nós estamos suscetíveis e passivos aos mandos e desmandos do capital estrangeiro. Uma Romi-Isetta participou da Caravana da Integração Nacional percorrendo 7.000 Km por diversos Estados do país e entrou em Brasília com o então presidente Juscelino Kubitischek. Nesta “volta ao país” esteve em Porto Alegre (RS) e foi recebida pelo então prefeito Leonel Brizola. 

O Romi-Isetta tinha algumas soluções originais. Por exemplo: o motor de partida e o dínamo, que alimenta o sistema elétrico de 12 volts, formam uma única peça. Debaixo do banco há uma torneirinha, como nas motos, que comuta a passagem para a reserva de 3 litros do tanque de combustível (com capacidade de 13 litros). E a transmissão é feita por duas correntes, que levam a força do motor às rodas traseiras. Os primeiros Romi eram equipados com motor dois tempos, de dois cilindros. Para o modelo 1959, o último a ser fabricado regularmente, a fábrica anunciava nas revistas uma velocidade máxima de 95 km/h, um consumo de 25 km/l e garantia que o carro “vence com sobras as subidas mais íngremes”, graças ao novo motor BMW de quatro tempos monocilíndrico, de 298 cc e 13 hp de potência. Descontado o entusiasmo do redator do “reclame”, 80 km/h por hora me parece uma velocidade mais próxima da realidade. Quanto às ladeiras, não ponho a mão no fogo. Nas retas, eu garanto: o carrinho desenvolve bem, desde que não haja timidez no trato com o acelerador. Dos buracos, é melhor passar longe. A suspensão é cumpridora, mas não pode fazer milagres com as rodas de aro 10. Mas os freios seguram bem a barra. Abrir o teto de lona é uma necessidade nos dias mais quentes: os grandes quebra-ventos não dão conta de ventilar a cabine.

Mesmo depois de encerrada a produção, alguns Romi-Isetta ainda foram montados, com o estoque de peças remanescente. No total, foram fabricadas cerca de 3000 unidades. O público nunca levou o Romi-Isetta muito a sério. Era visto mais como uma excentricidade do que uma solução prática de transporte. E o fato de ter ficado à margem da política de incentivos à indústria automobilística, durante o governo Juscelino Kubitschek, fez com que seu preço não fosse competitivo – em 1959, ele custava mais de 60% do preço de um Fusca. Esses fatores contribuíram em parte para encurtar sua temporada por aqui. Mas, assim como muitos animais pré-históricos, ele foi vítima da seleção natural, devido a suas próprias limitações. Especialmente a de locomover-se mais rápido.

Duas décadas depois de seu fim, em 1980, o empresário do ramo de autopeças Humberto Dias, de São Bernardo do Campo, SP, apresentou na Exposição da Pequena e Média Indústria, realizada na capital paulista durante a Brasil Export 80, o protótipo de um novo Isetta. Denominado Diaseta, fusão de seu sobrenome com a marca original, era um Romi-Isetta de motor BMW com algumas alterações, como pára-choques inteiriços, faróis e luzes de direção integrados ao dianteiro e duas tomadas de ar laterais. As lanternas traseiras eram emprestadas do Gol, incluindo luzes de ré ausentes do modelo antigo, e foi eliminado o teto solar — mas havia intenção de reintroduzi-lo para, imagine, aumentar a segurança em caso de colisões… O pára-choque maior implicou a redução da base da porta única e no painel foram adotados instrumentos do Fiat 147. Dias pretendia fabricar o motor a partir do projeto original da BMW, o que demonstrava desconhecimento das dificuldades envolvidas. Apesar do momento mais propício a minicarros — vários outros foram apresentados na mesma época, como Alcar, Dacon 828, Economini, Fibron 274, Mignone, Gurgel Xef –, o projeto fracassou e o Isetta permaneceu apenas na memória dos saudosistas.

Fonte: 
http://www.netpar.com.br/fxl/romiseta/romiseta.htm
 
acesso em junho de 2005
revista CLASSIC SHOW – Ano I, n°2
 
http://quatrorodas.abril.com.br/classicos/grandesbrasileiros/0902romiiseta.shtml
acesso em novembro de 2005
 
http://www2.uol.com.br/bestcars/classicos/isetta-4.htm
 
acesso em dezembro de 2007
 
Agradeço a colaboração de Vilani Júnior (vilani.jr@globo.com) que enviou material em junho de 2005 para composição desta página
 
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